segunda-feira, 18 de abril de 2011

Qual é o limite da propaganda? - SOS Fauna presa num elevador de discussão

É inerente associar o sucesso de uma determinada marca, empresa, causa nobre ou ação social à eficiência de sua propaganda/publicidade, ou seja, da divulgação criativa, inovadora e marcante de suas ideias para os públicos que se deseja atingir. Para que este objetivo seja alcançado, tornaram-se rotineiras as ações externas e de guerrilha, envolvendo pessoas que estão em atividades habituais do cotidiano e que são surpreendidas por uma intervenção da marca ou instituição.

Porém, é necessário que se haja um debate acerca da necessidade de um limite para esta propagação de ideias e, se ele existisse, qual seria o critério estabelecido para este fim. Uma das visões acerca desse assunto é descrita por Edson Crescitelli no artigo Crise de credibilidade da propaganda: considerações sobre seu impacto na eficácia da mensagem, publicado na revista da Facom, n. 12, 1 sem. 2004 (p. 58):

"Existe, no entanto, um outro aspecto que é mais inerente à propaganda, que é a abordagem inadequada e socialmente condenável utilizada para persuadir os consumidores. Nesse sentido, para atingir seus objetivos, a propaganda, não raro, se torna racista, preconceituosa, discriminatória, ridiculariza minorias, ou seja, coloca a ética de lado e ignora os efeitos colaterais de suas mensagens."

Esta declaração, para muitas pessoas, torna o caso que será mostrado a seguir um exemplo de como a propaganda pode passar de seus limites para tentar convencer os públicos da importância de sua causa na sociedade.

No mês de abril de 2011, a Media Contacts, em parceria com a ONG (Organização Não-Governamental) SOS Fauna Brasil, que, segundo o seu site oficial, atua na defesa e conservação da fauna silvestre brasileira, combatendo o tráfico de animais silvestres, fizeram uma ação com a ideia de conscientizar as pessoas sobre este tráfico e o quanto os animais sofrem de maus-tratos nas prisões e nas gaiolas, onde muitos passam, às vezes, a vida inteira.

Para esta (tentativa de) conscientização, o cenário escolhido foi alguns elevadores de prédios. Com uma câmera escondida alocada no teto, pessoas eram surpreendidas com a paralização do elevador. Pelas filmagens disponibilizadas na Internet, muitas pessoas ficaram apreensivas  e nervosas por conta desta situação complicada, dentre elas um menino acompanhado, aparentemente, de seu pai e um homem que até coloca o seu capacete para se proteger.

Depois de alguns segundos, o elevador volta a funcionar e, ao chegar ao andar do prédio determinado, as pessoas receberam um cartão da ONG com os seguintes dizeres: "Se ficar preso por alguns segundos já é assustador, imagine por toda a vida". As imagens desta ação estão disponibilizadas a seguir e já foram vistas por quase 70 mil vezes no canal oficial da organização no Youtube.



A partir da apresentação desta estratégia de conscientização do público formulada pela SOS Fauna Brasil, o que se pergunta é: a ação foi invasiva ao público ou se destaca por sua genialidade e ousadia? È necessário lembrar que poucos prédios aprovaram a ideia de parar seus elevadores por alguns segundos para a realização deste video.

No vídeo postado acima, até o fechamento deste post, foram contabilizados 430 comentários. Destes, 159 gostaram da ação proposta por várias razões (ousadia da ONG, conscientização dos homens ao "sentirem na pele" o que os animais sofrem) e 140 não gostaram do vídeo, entre outros motivos, pela escolha errada do público alvo e até pensando como processar a organização pelo crime de cárcere privado. Além disso, 27 comentários foram destinados a cena em que um homem coloca o capacete para se proteger de uma eventual queda (alguns defensores do vídeo declaram que os "animalzinhos não tem capacete para se proteger").

É necessária, sim, uma análise mais profunda dos prós e dos contras deste comercial. Porém, a inserção desta estratégia serve, além para divulgar a ONG e o seu trabalho de 20 anos em prol da Natureza, para também inserir este debate sobre a propaganda e os seus limites éticos e morais. A discussão está em aberto.

2 comentários:

  1. Na minha opinião, essa campanha passou sim dos limites. Existem diversas formas, inclusive com ações de guerrilha, de se trabalhar a conscientização ambiental, seja com atores ou com outros artifícios.

    Antes de colocar uma ação dessas em prática é preciso pensar no público que vai "servir de exemplo". E se alguma dessas pessoas tivesse um ataque cardíaco, quem se responsabilizaria? A ONG? A Agência?

    Tenho medo se um dia pensarem em fazer uma campanha contra o uso de casacos de pele.

    ResponderExcluir
  2. Oitenta (vulgo Marcelo ^^), muito obrigada por seu comentário, que abrilhanta esta discussão!

    A questão do público alvo foi uma das grandes críticas feitas a esta ação, por envolver senhoras, geralmente com maior fragilidade física a emoções mais intensas (como o medo de ficar preso no elevador), e crianças (mais suscetíveis a se envolverem com maior intensidade a situações traumáticas).

    Realmente, esta falta de critério na abordagem das pessoas foi uma das questões que geraram esta polêmica em torno da SOS Fauna.

    ResponderExcluir