segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Comunicação e intertextualidade - Posse de Dilma Rousseff sob a ótica de #galvaonaposse

A inserção de cases de comunicação não possui restrição de dia, nem de contexto. Basta somente que se tenha nas mãos um texto passível de análise para que algum estudo se inicie, seja visando o lado sociológico, cultural, midiático ou linguístico. Mas será que um texto é apenas um único texto somente?

É esta uma das perguntas que Koch, Bentes e Cavalcante (2007, p. 14)* tentam responder, baseando-se em renomados teóricos da Linguística. Para citar um exemplo, os autores descrevem o postulado dialógico de Bakhtin (1929): "um texto (enunciado) não existe nem pode ser avaliado e/ou compreendido isoladamente: ele está sempre em diálogo com outros textos." Ou seja, todo texto é um intertexto, possui outros textos dentro dele, causando, assim, a tão falada intertextualidade.

Neste mesmo livro, há a descrição de vários tipos de intertextualidade, que são importantes para os profissionais de comunicação, pois conseguem fazer com que seu produto ou ideia seja reconhecida rapidamente e lembrada por muito mais tempo. No caso a seguir, o fenômeno visto é a intertextualidade estilística (2007, p. 19), em que "o produtor do texto, com objetivos variados, repete, imita, parodia certos estilos ou variedades linguísticas (...)". No caso, o estilo copiado é de um famoso narrador esportivo da Rede Globo.

No primeiro dia do ano de 2011, figurava nos Trending Topics do microblog Twitter a hastag #galvaonaposse, que foi criada por Reinaldo Andrade e com o apoio do comentarista da ESPN Leonardo Bertozzi. A expressão retratava frases tipicamente usadas pelo locutor Galvão Bueno, só que adaptadas a tudo que ocorria na posse de Dilma Rousseff como Presidenta da República. Este novo fenômeno ocorrido no Twitter chegou rapidamente aos jornais eletrônicos, como no caderno on-line de Esportes da Folha de São Paulo e na página de Esportes do portal UOL.

E até mesmo repórteres da Rede Globo aderiram ao movimento de frases que o Galvão falaria neste momento especial para a democracia brasileira, criando ou dando retweet nas sentenças, como pode-se ver na figura abaixo, retirada do Twitter do jornalista esportivo da emissora Bruno Laurence.


Este fenômeno também ocorre, há muito tempo, com o ator Chuck Norris e, recentemente, com o jogador Brasão, na época jogador do Santa Cruz. A diferença entre estes fenômenos e o de Galvão é que, enquanto os primeiros reforçavam as "qualidades" dos personagens com frases de efeito, o que se viu em #galvaonaposse foi justamente o contrário: as características de narração que o Galvão possui, como as frases de efeito dele, reforçaram o que acontecia na posse, seja pelo lado humorístico ou crítico.

Outras frases interessantes retiradas de perfis aleatórios no Twitter durante a tarde do dia 1º de janeiro sobre a possível narração de uma posse presidencial, feita por Galvão Bueno:
- "assistir a #possedilma é teeste pra cardíaco amiiigo!! #galvaonaposse" (via @MrJuniorAzer);
- "Aponta o centro da mesa o ministro, Sr. Cesar Peluzzo. Final do discurso da presidente Dilma Roussef" #galvaonaposse (via @gabriel_imortal);
- "- Reginaldo, seu palpite. - Dilma. - Burti, você. - Dilma. - Mariana, o seu. - Dilma. - Eu vou de Vettel. VEM A LUZ VERMELHA!  #galvaonaposse" (via @SUILSC);
- "Sai que é suuua Dilma!!! #galvaonaposse" (via @wilsondealmeida).
 


É interessante perceber a identificação das frases com dois esportes populares no Brasil: o futebol (mais especificamente na frase repostada por Laurence e na 2ª  e 4ª frases retiradas da busca) e a Fórmula 1 (na 3ª frase, em que Dilma, implicitamente, é comparada a uma Ferrari). Além disso, perguntas para o comentarista de arbitragem Arnaldo César Coelho foram frequentes, como esta frase.

Com isso, pode-se ver a importância do entendimento da intertextualidade existente entre estas duas "vozes" diferentes (uma locução esportiva "falando", "interferindo", nem que seja de modo ficcional, com uma cerimônia de posse da primeira mulher presidenta do Brasil) para que a comunicação e o entendimento das expressões sejam eficazes. E isso, com certeza, ocorreu, basta ver a repercussão obtida da tag #galvaonaposse num dia em que o acesso ao Twitter é muito baixo em alguns horários. O ano de 2011 começou muito bem para a rede de microblogs e para os twitteiros criativos.

* KOCH, Ingendore G. Villaça; BENTES Anna Christina; CAVALCANTE,. Mônica Magalhães. Intertextualidade: diálogos possíveis. São Paulo: Cortez, 2007.

4 comentários:

  1. Muito legal sua abordagem a respeito de um "fenômeno" que despretenciosamente surge em uma rede social. Valeu pela citação da minha frase, pensamos que fazemos uma coisa tola, mas vendo a repercussão que isso teve, chegamos a uma conclusão diferente.

    @gabriel_imortal

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  2. Gabriel,
    muito obrigada por visitar este blog!

    Realmente, alguns fenômenos de Internet, principalmente do Twitter, começam meio que despretenciosamente, como o caso de #galvaonaposse, mas ganham uma grande proporção até pelo fato de o microblog ter aumentado muito seu número de membros no Brasil.

    Volte sempre por aqui!

    Abraço!

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  3. Maíra,

    A frase da Fórmula 1, na verdade, é minha:

    http://twitter.com/ecolombari/status/21256505458167808

    E não diria que a intenção era comparar Dilma a uma Ferrari. Na verdade, diria que os "palpites" Dilma e Vettel não tem uma relação metafórica entre si!

    Do mais, abraços!

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  4. Emanuel,

    Obrigada por comentar no blog!

    A escolha das frases foi aleatória e várias expressões como esta apareceram na busca... o seu perfil, acredito eu, não apareceu enquanto produzia esta pesquisa!

    Acredito também que sua colocação esteja correta, porém, esta frase pode ser interpretada, a meu ver, de várias maneiras, como a minha e a sua.

    Na última corrida de Fórmula 1, Vettel e Alonso disputavam o título, sendo que o piloto da Ferrari era o grande favorito, assim como Dilma. No esporte, Vettel, pouco falado, ganhou, ao contrário de Alonso. Na política, isso quase ocorreu também.

    Pode ser também pelo fato de a Globo não ser tão favorável politicamente à Dilma... enfim, peço desculpas pela confusão e visite mais vezes o blog!

    Abraço!

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