sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Publicidade e questões de gênero - Hope bateu o carro no estereótipo?

Sabe-se que há uma grande variedade de peças pubilcitárias espalhadas por quase todos os ambientes, sejam eles materiais ou midiáticos. Um dos grandes públicos, para quem estas ações publicitárias se dirigem, são as mulheres, e a tônica do discurso e da imagem referidos a este gênero são praticamente predominantes em várias décadas, como mostra o artigo Gênero no Texto Visual: a (re)produção de significados nas imagens técnicas (fotografia, televisão e cinema), escrito por Monique Vidal Pires (2006, págs. 06-07):

"Em todas as décadas analisadas, apesar das mudanças sociais acontecidas no Brasil, o discurso que vigora é o essencializante - de que as mulheres são essencialmente sedutoras, naturalmente preparadas para a maternidade e socializadas para o casamento. (...)
Assim, percebe-se que a publicidade reforçou a representação social dos papéis próprios às mulheres, que apesar de toda a luta, as mulheres continuam interiorizando – assujeitadas - os esteriótipos de 50 anos atrás, mas agora carregam também a sexualidade exacerbada, um dos fardos da sociedade pós-revolução sexual, que libertou as correntes que prendiam os desejos femininos, mas trouxe o corpo feminino à berlinda, na publicidade e na mídia em geral. (...) Entretanto transformaram-se em um ser explorado sexualmente pelos meios de comunicação, que limitam as mulheres à nádegas, vaginas e seios, disponíveis para todos."

No último dia 20 de setembro, foi divulgado o novo comercial da marca de lingeries Hope, tendo como protagonista a modelo Gisele Bündchen. De acordo com uma matéria publicada no Portal Examea campanha “ensina” como a sensualidade da mulher, com o auxílio do poder de sedução das lingeries, pode impressionar os homens e convencê-los de maneira mais fácil a aceitar situações complicadas, como a mudança da mãe da mulher para a casa do casal, o estouro do cartão de crédito ou que ocorreu uma batida no carro do homem (vídeo incorporado a seguir).


Mas o que era pra ser apenas mais um comercial de lingerie, estrelado pela modelo brasileira, acabou transfornando-se numa grande polêmica. A Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) da Presidência da República recebeu várias críticas e indignações a respeito deste comercial. Com essas reclamações, foram mandados dois ofícios pela Secretaria: um ao Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), para pedir a suspensão da propaganda, e um à empresa Hope. 

Segundo matéria publicada no portal G1 em 29 de setembro, a nota divulgada pela SPM à empresa diz: “‘Hope Ensina’ é a campanha da empresa que ‘ensina’ como a sensualidade pode deixar qualquer homem ‘derretido’. Nela, a modelo Gisele Bundchen estimula as mulheres brasileiras a fazerem uso de seu 'charme' (exposição do corpo e insinuações) para amenizar possíveis reações de seus companheiros frente a incidentes do cotidiano”.

Esta discussão se a propaganda mostra realmente o estereótipo de mulher como objeto sexual ou não possui muitas interrelações às discussões de gênero, a começar pela própria constituição do comercial. Nos três vídeos, Gisele aparece, primeiramente, com roupas discretas, aparentando ser mais baixa e, ideologicamente, mais medrosa e submissa a uma possível reclamação do homem. Já na segunda parte do comercial, o ângulo da filmagem, aliado ao uso da lingerie e do salto alto, mostra uma mulher mais decidida e que se utiliza de insinuações para evitar uma bronca do seu parceiro.

A pergunta que fica é: a publicidade pode se utilizar destes estereótipos, montados ou não, atribuidos às mulheres para poderem promover suas marcas, muitas destinadas justamente a esse público feminino? E, se sim, qual seria o limite para estas intervenções?

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