segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Fiscalização é tabu no Brasil. Mas isto tem que mudar!

Por Manoel Marcondes Neto

Compro a briga do tema espinhoso, na torcida de que a bola levantada renda um vôlei com tiebreak disputado.

Não que se deva defender a nossa incapacidade de fiscalizar, no Conrerp, na Anvisa, na Anac, no Cremerj, na Anatel, no Crea, na Aneel, na OAB, na Agetransp etc. etc. etc., mas saber que isto é um traço cultural arraigado e, quase já, um traço institucional.

Reconhecer o mal é o primeiro passo para se receitar um antídoto.

Quando foi a última vez que você ouviu alguém dizendo querer ser fiscal?

Talvez não tenha sido há tanto tempo assim... eu, por exemplo, ouvi, ainda semana passada, de um ex-colega de turma de pós-graduação, que estava dedicando todo o ano de 2012 a estudar para um concurso público.

Quando perguntei qual concurso? Para onde? Para quê? – ele respondeu-me de bate-pronto, sem pestanejar: “qualquer um; fiscal do tesouro nacional, fiscal de ICMS, fiscal da fazenda municipal...”.

Ocupação? Concurseiro!

Pois é com esses perfis que se forma a maioria das equipes de fiscalização no Brasil. E é por esse ingresso de “qualquer um” que quase nada é fiscalizado corretamente no país. Há exceções. Mas as exceções confirmam as regras.

As pessoas estão muito interessadas no salário, nos benefícios e na aposentadoria. E nada interessadas com o que terão que fazer quotidianamente por trinta e cinco anos para fazer jus ao salário, aos benefícios e à aposentadoria.

E elas também não estão nem um pouco preocupadas se tais funções exigem esta ou aquela formação, esta ou aquela aptidão, este ou aquele pendor, habilidades “x”, competências “y”, riscos, responsabilidades. Nada disso. Só a posição e a remuneração.

“Estabilidade”.

Essas pessoas querem fazer o seu concurso e se largar na tal da “estabilidade”. A maioria de meus colegas de universidade pública, aliás, não usa a estabilidade para ter a liberdade de criticar o quê seja ou quem quer que seja. Usam-na para trabalhar o menos possível. Ouve-se:

– Que se dane o país, que eu já defendi o meu! Quem quiser que corra atrás nesse Brasil de corruptos! Não sou polícia!

Ou:

– Fiscalizar a empresa que está poluindo, que está vendendo sem faturar formalmente, ou recebendo “por fora”, caixa 2, ou que desrespeita a legislação trabalhista para quê, "meu irmão"? É tudo bandido! Se você não “abrir o teu olho” acaba numa vala com a boca cheia de formiga...

Vamos relembrar o recente episódio do desabamento do edifício no Rio de Janeiro... e suas vítimas fatais... De quem era a responsabilidade? Do síndico? Dos proprietários ou dos locadores? Dos arquitetos? Das empreiteiras das reformas individuais? Ou da CIPA, da brigada da segurança? – Ah, vamos derrubar esta parede e fazer um salão mais amplo, com mais posições no call center... Deu no que deu. Mortes, perdas irreparáveis. De vidas, de negócios, de documentos, de histórias. Quantos anos serão consumidos em burocracia? E em procrastinação jurídica? Será só uma questão de receber indenização do seguro? E quem não fez seguro, faz o quê?

Ninguém é culpado?

É preciso mudar. E trata-se de uma mudança difícil, pois que mudança do tipo “cultural”. Mudanças culturais são demoradas e trabalhosas, mas têm que começar algum dia e por alguém. Comecemos nós, relações-públicas, a mudar a cultura da nossa própria fiscalização, no nosso mundinho restrito, cuidando da melhor comunicação institucional possível, ao alcance de pessoas e organizações necessitadas de divulgação.

Somos os profissionais a quem a lei delega bem realizar essa tarefa, com responsabilidade técnica, tida não de graça, mas às custas de uma formação que nos consumiu anos de dedicação, investimento e energia vital. Coloquemos mãos à obra, pois. Se começarmos agora a implementar uma mudança de cultura, talvez já a próxima geração de colegas colha os frutos de viver em uma terra menos tosca, mais inteligente, menos bruta e mais feliz.

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