quarta-feira, 6 de março de 2013

Relações (in)esperadas entre propaganda e vaidade

Por Maíra Masiero

"Vaidade das vaidades, diz o Eclesiastes, vaidade das vaidades! Tudo é vaidade." (Eclesiastes 1, 2)

Por que começar este post com uma citação bíblica? Justamente para confirmar a ideia desse autor à respeito deste atributo tão explorado, em especial, pelas ações de comunicação. Mas qual o seu significado e como a publicidade pode contribuir para a queda (ou manutenção) de estereótipos vinculados a vaidade?

Inicialmente, é necessário constatar que há várias formas de se definir o que é vaidade, dependendo do contexto e da linha de pensamento seguida. Destaca-se, para este texto, a relação entre aquele conceito e o narcisismo, nas ideias de Lebel (2002), citadas por Rafael de Pontes Ramos Alves Freitas et al., no artigo Relação da vaidade com a escolha entre marcas globais ou locais para categorias de produtos com base na matriz FCB (2007, p. 3):

"(...) uma última abordagem do conceito explora uma especificidade obscura da ideia de vaidade. Até então, a vaidade não vinha sendo estudada em termos psicológicos que envolvem o narcisismo. O narcisismo, que tem uma origem psicanalítica, é caracterizado pela grande atribuição de importância a si próprio, pelo exagero de fantasias de sucesso próprio, pelo exibicionismo, por intolerância com criticas recebidas, pela falta de reciprocidade e pela dificuldade de empatia.".

Quando se oferece muita importância ao seu próprio ser, geralmente as pessoas fazem de tudo para obter a aparência mais bonita e, se isso não se realizar pelos meios naturais, buscar intervenções estéticas, cirúrgicas e, no caso de exposição de fotos na Internet, manipular as imagens até alcançar o que é chamado de "corpo ideal".

Algumas propagandas mais recentes são exemplos e pontos de partida para que o debate em relação a vaidade se fortaleça. A marca de sabonetes Dove, conhecida por propagar campanhas que visam destacar a "real beleza", fez uma campanha no Canadá para impactar quem manipula imagens de modelos para revistas, campanhas, catálogos, entre outros veículos e mídias.

Foi disponibilizado, em sites específicos, um arquivo que prometia facilitar a vida desses profissionais, aplicando efeitos especiais nas fotos em apenas um clique. Porém, o que acontecia é que a foto manipulada voltava ao status original, trazendo a seguinte mensagem: “Não manipule nossas percepções de beleza real”. A alteração poderia ser desfeita posteriormente, mas a ação foi eficiente, pois observou o nicho - os profissionais de edição - e conseguiu agir numa plataforma específica.


Já no Brasil, uma propaganda de vaidade masculina (depilação peitoral) foi retirada do ar justamente por promover um preconceito contra um outro "tipo de vaidade": a de preservar os pelos do peito masculino. A marca Gillette criou uma propaganda para o Carnaval, com o destaque para a vinda ao Brasil do rapper coreano Psy, cantor do hit “Gangnam Style”, e a participação da apresentadora Sabrina Sato e das gêmeas do nado sincronizado Bia e Branca.

Elas utilizam a expressão “quero ver raspar” para compor uma versão diferente do refrão da música coreana. No filme, as mulheres resolvem desafiar os homens para ver quem tem coragem de raspar o peito para agradá-las. O desdobramento da campanha também se fez presente nas mídias sociais, em figuras postadas na fanpage oficial da Gillette no Facebook, que remetem, à depilação peitoral, uma maior conquista das mulheres, como demonstram as marcas de batom ao longo do corpo masculino.


O caso foi levado ao Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), após ser alvo de críticas de consumidores, que consideraram-na um "preconceito contra os peludos" e que há, nesse comercial, o estereótipo de que o grupo de homens com pelos no peito são “nojentos”. Muitos ainda lembraram outra peça publicitária da marca, em que há a menção da expressão "homem das cavernas" como algo negativo para a conquista feminina.

Com esses casos, o que se pode concluir sobre a influência da propaganda na vaidade humana é que há dois lados do processo criativo: o de desmistificar padrões de beleza preestabelecidos, valorizando a beleza natural (no caso da Dove) ou de impor uma situação estética favorável (ou não) a algo inerente ao ser humano (no caso da Gillette). Se tudo é vaidade, como diz a citação inicial do post, de que lado destas relações pode-se ficar?

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