A música de Dorival Caymmi é inspiração, sempre, mas é a
coluna de Merval Pereira (n’O Globo de 28/08) que presta-nos um favor, pinçando
do novo livro de Manuel Castells, “Redes de indignação e esperança”, alguns
conceitos extraídos da observação atenta do pesquisador sobre as recentes
explosões de manifestação popular que levaram a figura anônima, mascarada, do
“protester” à condição de “personalidade do ano” da revista Time, em 2011.
Mantendo-se nas pesquisas de opinião pública com vistas ao
pleito presidencial de 2014, apesar de “sem partido”, Marina Silva conseguiu
sair na frente de todo o espectro político brasileiro, do experimentadíssimo
PMDB ao novíssimo PSD, porque anteviu, nas palavras do colunista, “este
movimento autônomo das ruas que rejeita as formas tradicionais de fazer
política” – algo comum às manifestações do Brasil atual, às manifestações da
chamada “primavera árabe” e aos movimentos “occupy” antiglobalização que
pipocaram ao redor do mundo, ora contra a OMC, nos EUA, ora contra o FMI, na
Itália, ora contra Wall Street. Aqui, pergunta-se: “quem matou Amarildo?”.
Manuel Castells chama a base de todas essas manifestações –
internet + celulares + redes sociais – de “plataforma tecnológica da cultura de
autonomia” e, no seu livro, diz que “Marina é a exceção entre os políticos –
por estar conectada aos novos anseios – e os movimentos sociais em rede vão
continuar a lutar, debater, evoluir e, por fim, a se dissolver em suas atuais
condições de existência, como aconteceu com todos os movimentos sociais da
História”.
O autor, talvez o maior estudioso do fenômeno que ele mesmo
batiza de “autocomunicação de massas” conclui que “é muito cedo para avaliarmos
o resultado final desses movimentos, embora já possamos dizer que regimes mudaram,
instituições foram desafiadas, e a crença no capitalismo financeiro global
triunfante foi abalada, possivelmente de maneira irreversível, na mente da
maioria das pessoas”.
A (in)conclusão a que me permito, no caso brasileiro, é que
há arranhões aqui e ali, sim, mas o “status quo” político-econômico não se
moveu um milímetro. Ministros, governadores e prefeitos continuam licitando
toalhas de algodão egípcio e caviar para seus palácios. Os jatinhos da Força
Aérea Brasileira transformaram-na numa empresa de táxi aéreo (deficitária,
claro, e às nossas custas). São Paulo tornou-se, agora, “a” capital dos
helicópteros, superando Tóquio e Nova Iorque. E a propaganda política dos
partidos continua repetindo na TV a ladainha tosca de que “ouvimos as ruas e queremos
a institucionalização da democracia no Brasil”, ou seja, dizem rigorosamente
nada para que tudo continue como está. Acho que a “imprevisibilidade positiva”
mencionada por Manuel Castells precisa continuar...
E ele finaliza: “o que é irreversível no Brasil e no mundo é
o empoderamento dos cidadãos, sua autonomia comunicativa e a consciência dos
jovens de que tudo o que sabemos do futuro é que eles o farão. Mobilizados”.
Que Deus o ouça, xará.
Se eu tivesse 21 anos, hoje, num país cuja Câmara dos Deputados absolve um seu membro já condenado e já preso, talvez me filiasse ao Black Bloc.
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