terça-feira, 1 de abril de 2014

O cinquentenário dos anos de chumbo - Comunicação e ditadura militar no Brasil

Por Maíra Masiero

Há 50 anos, a população brasileira se via às voltas de um momento que iria mudar a história do país para sempre: o início do regime militar institucionalizado no Brasil que, por mais de duas décadas, trouxe o "milagre econômico", ocasionou a morte e o desaparecimento de muitos opositores, além de promover a censura e o cerceamento da liberdade de expressão nas mais diversas plataformas existentes na época.

Com isso, pode-se pensar que o exercício da comunicação neste período histórico foi completamente abolido, o que não é verdade. Tanto pelo lado opressor quanto pelo oprimido, as estratégias de comunicação foram usadas, na medida do possível, para propagar seus interesses e defender seus pontos de vista acerca do regime militar.

Do lado governamental, uma das principais medidas tomadas (e que ainda acarretam num posicionamento negativo acerca das Relações Públicas) foi a criação da Assessoria Especial de Relações Públicas (AERP) em 1968, pelo então presidente Costa e Silva, que se utilizava de propagandas efusivas e persuasivas para convencer a população dos "benefícios" da ditadura, conforme mostram Alana Sdroievski Gonçalves, Barbara Terra Parra de Almeida e Jéssica Danielle Lazzarom de Oliveira, no artigo A Comunicação Institucional do Governo Militar: A Assessoria Especial de Relações Públicas e a Revista Manchete (2011, p. 4):

"A criação da AERP propunha estabelecer um canal de comunicação entre o governo e a sociedade, pois acreditava-se que a população que a população estava mal informada a respeito das ações do regime militar. Além disso, esse canal de comunicação foi criado para desconstruir a imagem negativa que a opinião pública detinha do governo e expor o trabalho dos militares pós-golpe de 64. Conforme Margarida Kunsch, “(...) ela [AERP] funcionou como uma verdadeira agência de propaganda política, para ‘vender’ o regime autoritário de forma massiva, disfarçando a censura mais violenta que este país já teve” (KUNSCH, 1997, p. 26). 
Durante o governo de Médici a AERP foi chefiada por Octávio Costa e difundiu uma série de propagandas institucionais a respeito do resultado das ações do governo militar no Brasil, como o milagre econômico."

Foram várias as propagandas utilizadas pelo Governo para tentar mostrar uma imagem positiva do Brasil neste período tumultuado, como a famosa frase "Brasil, ame-o ou deixe-o", mais utilizada nos tempos mais ásperos do regime e mais "promissores" da economia. Outra propaganda televisiva da época tem, como slogan, "O Brasil é feito por nós", em comemoração ao Dia da Pátria.



Da outra esfera política, a oposição ao regime mostrou sua força, mesmo em meio à censura e aos riscos de prisão e de exílio. Músicas, peças teatrais, filmes, jornais alternativos e outros instrumentos tentaram expressar suas opiniões e seus descontentamentos, enquanto outros gêneros musicais e televisivos ficavam afastados do olhar da censura, ao menos prioritariamente, como o movimento da Jovem Guarda, grupos nacionais de rock, música sertaneja e alguns programas humorísticos e novelas da época. O vídeo a seguir mostra algumas músicas que, nas entrelinhas, retrataram as dificuldades da sociedade e daqueles que lutavam diretamente contra a censura.



Vale ressaltar que, no período da ditadura, houve vários fatos relevantes para a atividade de Relações Públicas, como a instituição do primeiro curso da área, em 1967, na Escola de Comunicação e Artes da USP (Universidade de São Paulo), e vários decretos que auxiliaram esse campo profissional a ser reconhecido e oficializado.

Porém, há quem relacione negativamente, até hoje, o profissional de Relações Públicas com a execução do regime ditatorial, por causa, provavelmente, de ser o único elo oficial de informações entre o Governo e a população nos anos em que a censura foi mais agressiva, e de auxiliar na manutenção da imagem dos governantes e das estratégias políticas e econômicas junto ao povo.

E é por essa razão que os relações-públicas precisam esclarecer a sociedade de que o seu papel vai muito além do que os "anos de chumbo" expressaram à opinião pública, e que os comunicólogos também lutam pela liberdade e por uma política democrática, com liberdade de expressão e livre de todas as torturas e exílios.

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