Compro a briga do tema espinhoso, na torcida de que a bola
levantada renda um vôlei com tiebreak disputado.
Não que se deva defender a nossa incapacidade de fiscalizar,
no Conrerp, na Anvisa, na Anac, no Cremerj, na Anatel, no Crea, na Aneel, na
OAB, na Agetransp etc. etc. etc., mas saber que isto é um traço cultural
arraigado e, quase já, um traço institucional.
Reconhecer o mal é o primeiro passo para se receitar um
antídoto.
Quando foi a última vez que você ouviu alguém dizendo querer
ser fiscal?
Talvez não tenha sido há tanto tempo assim... eu, por
exemplo, ouvi, ainda semana passada, de um ex-colega de turma de pós-graduação,
que estava dedicando todo o ano de 2012 a estudar para um concurso público.
Quando perguntei qual concurso? Para onde? Para quê? – ele
respondeu-me de bate-pronto, sem pestanejar: “qualquer um; fiscal do tesouro
nacional, fiscal de ICMS, fiscal da fazenda municipal...”.
Ocupação? Concurseiro!
Pois é com esses perfis que se forma a maioria das equipes
de fiscalização no Brasil. E é por esse ingresso de “qualquer um” que quase
nada é fiscalizado corretamente no país. Há exceções. Mas as exceções confirmam
as regras.
As pessoas estão muito interessadas no salário, nos
benefícios e na aposentadoria. E nada interessadas com o que terão que fazer
quotidianamente por trinta e cinco anos para fazer jus ao salário, aos
benefícios e à aposentadoria.
E elas também não estão nem um pouco preocupadas se tais
funções exigem esta ou aquela formação, esta ou aquela aptidão, este ou aquele
pendor, habilidades “x”, competências “y”, riscos, responsabilidades. Nada
disso. Só a posição e a remuneração.
“Estabilidade”.
Essas pessoas querem fazer o seu concurso e se largar na tal
da “estabilidade”. A maioria de meus colegas de universidade pública, aliás,
não usa a estabilidade para ter a liberdade de criticar o quê seja ou quem quer
que seja. Usam-na para trabalhar o menos possível. Ouve-se:
– Que se dane o país, que eu já defendi o meu! Quem quiser
que corra atrás nesse Brasil de corruptos! Não sou polícia!
Ou:
– Fiscalizar a empresa que está poluindo, que está vendendo
sem faturar formalmente, ou recebendo “por fora”, caixa 2, ou que desrespeita a
legislação trabalhista para quê, "meu irmão"? É tudo bandido! Se você
não “abrir o teu olho” acaba numa vala com a boca cheia de formiga...
Vamos relembrar o recente episódio do desabamento do
edifício no Rio de Janeiro... e suas vítimas fatais... De quem era a
responsabilidade? Do síndico? Dos proprietários ou dos locadores? Dos
arquitetos? Das empreiteiras das reformas individuais? Ou da CIPA, da brigada
da segurança? – Ah, vamos derrubar esta parede e fazer um salão mais amplo, com
mais posições no call center... Deu no que deu. Mortes, perdas irreparáveis.
De vidas, de negócios, de documentos, de histórias. Quantos anos serão
consumidos em burocracia? E em procrastinação jurídica? Será só uma questão de
receber indenização do seguro? E quem não fez seguro, faz o quê?
Ninguém é culpado?
É preciso mudar. E trata-se de uma mudança difícil, pois que
mudança do tipo “cultural”. Mudanças culturais são demoradas e trabalhosas, mas
têm que começar algum dia e por alguém. Comecemos nós, relações-públicas, a
mudar a cultura da nossa própria fiscalização, no nosso mundinho restrito,
cuidando da melhor comunicação institucional possível, ao alcance de pessoas e
organizações necessitadas de divulgação.
Somos os profissionais a quem a lei delega bem realizar essa
tarefa, com responsabilidade técnica, tida não de graça, mas às custas de uma
formação que nos consumiu anos de dedicação, investimento e energia vital.
Coloquemos mãos à obra, pois. Se começarmos agora a implementar uma mudança de
cultura, talvez já a próxima geração de colegas colha os frutos de viver em uma
terra menos tosca, mais inteligente, menos bruta e mais feliz.
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